domingo, 10 de janeiro de 2016

Ibama não deu opção aos índios Waimiri Atroari

07/01/2016 22:28
Presidente da Funai deu aval ao Ibama, que emitiu Licença Prévia do processo ambiental dentro da reserva sem consultar os indígenas. (Foto: Mário Vilela/Funai)
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Os índios Waimiri Atroari estão contestando o aval que o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), o petista João Pedro Gonçalves da Costa, concedeu ao Instituto Nacional de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e que permitiu, em 9 de dezembro passado, a emissão da Licença Prévia ambiental à concessionária Transnorte Energia S/A, responsável pela construção de 125 km da Linha de Transmissão Manaus-Boa Vista dentro do território indígena. A maior parte do território Waimiri Atroari fica localizada no Estado do Amazonas, mas abrange também a região sul de Roraima.
Em carta enviada à presidente do Ibama, Marilene Ramos, no dia 1º de dezembro, portanto, oito dias antes da emissão da Licença Prévia, 23 lideranças Waimiri Atroari afirmam que a etnia não foi consultada previamente por João Pedro Gonçalves sobre os impactos socioambientais da obra na terra indígena. Para construir a linha de transmissão, serão instaladas cerca de 250 torres de sustentação, o que levará centenas de operários para dentro da reserva onde vivem mais de 1,6 mil índios considerados de recente contato pela Funai.
A consulta prévia é determinada pela Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e o seu descumprimento constitui numa violação de direitos do povo. A OIT foi ratificada pelo governo brasileiro em 2002.
“A nossa comunidade não foi consultada previamente sobre o referido empreendimento e que em função do licenciamento por parte do Ibama, há problemas internos entre os grupos sociais que compõe a nossa Nação. (…) A Funai, mesmo sendo uma instituição do governo com missão de defender os direitos dos índios do Brasil, legalmente não pode falar em nome da nossa Comunidade Waimiri Atroari”, dizem os índios na carta encaminhada à Marilene Ramos, a qual a agência Amazônia Real teve acesso exclusivo.
A Licença Prévia do Ibama foi o primeiro passo do processo ambiental para que a concessionária Transnorte Energia S/A (formada por consórcio entre a Alupar e Eletronorte) consiga a Licença de Instalação, esperada para iniciar a obra. A linha de transmissão terá um total de 721 km partindo de Manaus para gerar 500 KV de energia em Boa Vista a partir da hidrelétrica de Tucuruí, no Pará. O linhão ligará o Estado de Roraima ao Sistema Integrado Nacional do Ministério de Minas e Energia (MME).
Segundo o Ibama, o traçado escolhido pela concessionária Transnorte Energia S/A é a alternativa 1, que consta do Estudo de Impactos Ambientais (EIA-Rima), que contemplou, em 2014, os estudos do componente indígena. O percurso vai acompanhar o acostamento da rodovia federal BR-174.
Foi nos anos 70, durante o governo da ditadura militar, que a estrada foi aberta dentro da terra indígena à revelia dos índios. Mais de 1,1 mil indígenas morreram em conflitos e doenças, conforme consta em documentos de investigação de crimes de violação de direitos humanos da Comissão Nacional da Verdade (CNV), criada pela Presidência da República.
Na carta, o líder da comunidade Waimiri Atroari, Mário Paruwe Atroari, e mais 22 indígenas afirmam que desde que tomaram conhecimento do aval da Funai ao Ibama para execução da obra do Linhão de Tucuruí, “dificuldades já estão ocorrendo na comunidade, surgindo conflitos que estavam contidos desde a abertura da BR-174”.
 “(…). Não somos contra a luz chegar em Roraima, só não entendemos de o porquê da Linha ter de ser dentro da nossa terra, trazendo de volta um passado que gostaríamos que não tivesse acontecido, no qual nossos parentes foram mortos e não tínhamos o direito de ter opinião. (…). Por favor, repetimos, não considere os termos do ofício que a Funai escreveu para o Ibama, como sendo uma autorização da Comunidade Waimiri Atroari. (…) Nós não falamos para o Presidente da Funai para ele autorizar o Ibama a emitir a licença”, diz a carta das lideranças.

O interesse político da obra

João Pedro Gonçalves visitou a terra indígena em outubro de 2015 (Foto: Mário Vilela/Funai)
João Pedro Gonçalves (de camisa azul) visitou a terra indígena em outubro de 2015 (Foto: Mário Vilela/Funai)

O presidente da Funai João Pedro Gonçalves, que assumiu o cargo por indicação do ministro de Minas Energia, ex-senador Eduardo Braga (PMDB/AM), fato que causou surpresa no movimento indígena pelo alinhamento político entre os dois (saiba mais aqui), autorizou o Ibama a conceder a Licença Prévia do chamado Linhão de Tucuruí, no dia 25 de novembro passado.
No documento, João Pedro alertou o Ibama sobre os possíveis impactos socioambientais da obra à etnia. “(…) No cumprimento de nossa missão institucional, é necessário alertar que qualquer intervenção naquela terra indígena sem a necessária construção de um consenso entre seus moradores, poderá acarretar novos conflitos que não são desejáveis nem ao empreendedor e tampouco àquela comunidade”, diz.
Mas, em outro trecho do ofício, João Pedro Gonçalves destacou a importância da obra do Linhão de Tucuruí, liberando o empreendimento.
“(…). Entretanto ao destacar que o Ibama, enquanto autoridade licenciadora já se manifestou acerca do melhor traçado para a Linha de Transmissão (…), e uma vez caracterizada, pelo governo federal, a imprescindibilidade da obra em seu traçado proposto (…), resta a esta Fundação, apresentar as condicionantes cabíveis no que se refere ao componente indígena (…)”, afirma o presidente da Funai.

Antes da decisão de João Pedro em favor da obra, o ministro Eduardo Braga já tinha acionado a Advocacia Geral da União (AGU) e o Ministério da Justiça para gestões junto à Funai visando o andamento do processo de licenciamento ambiental da linha de transmissão de Tucuruí. Chamado de “ação de obrigação de fazer”, o processo determinou que a Funai não impusesse mais restrição ao Linhão, como publicou o jornal O Estado de S. Paulo.
O motivo da ação do ministro Eduardo Braga foi porque a concessionária Transnorte Energia S/A comunicou à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) que tinha desistido da obra por causa da falta de licenciamento ambiental e ações judiciais.
Com a anuência da Funai, no dia 9 de dezembro de 2015 a presidente do Ibama, Marilene Ramos, concedeu a Licença Prévia à concessionária Transnorte Energia, formada por consórcio entre a Alupar (uma holding de controle nacional privado com atuação no setor de energia no Brasil, no Chile, na Colômbia e no Peru) e a Eletronorte (subsidiária da Eletrobras, que é responsável pelo controle de 45 usinas hidrelétricas no país). A licença ambiental indica a viabilidade do empreendimento por cinco anos, a contar de 2015. A conclusão da obra é prevista para 2018.

Ibama não deu opção aos índios

Índios dizem que João Pedro não fala por eles (Foto: Mário Vilela/Funai)
Índios dizem que João Pedro não fala por eles (Foto: Mário Vilela/Funai)

Também no dia 9 de dezembro, a presidente do Ibama, Marilene Ramos, respondeu aos questionamentos dos índios Waimiri Atroari em carta. No documento, que a reportagem teve acesso, o Ibama diz aos índios que os impactos socioambientais da obra do Linhão de Tucuruí dentro da terra indígena foram objetos do Estudo e Relatório de Impactos Ambientais (EIA-Rima). A versão final do estudo contemplou o componente indígena. Em 2014 foram realizadas audiências públicas em três cidades, das oito em que a linhão vai passar, mas o Ibama não cita a consulta aos índios.
Segundo a carta de Marilene Rocha, o EIA-Rima avaliou quatro alternativas de traçado da linha de transmissão de Manaus à Boa Vista: o n. 1, com 721 km, percorre 125 km dentro da reserva pelo acostamento da BR-174, passando por aldeias; o n. 2, com percurso de 716 km, passa pelos limites da terra indígena; o de n. 3, com 868 km, entra nas ocupações dos índios; e o de n. 4, de 902 km, segue a oeste e ao sul da TI Waimiri Atroari, sem interferir nas aldeias, mas este implica na abertura de estradas de uma região mais preservada da Amazônia.
O traçado escolhido, diz Marilene Ramos, foi a opção n. 1, que apresentou o de menor impacto ambiental à implantação do empreendimento, mas que fica dentro da TI Waimiri Atroari.
“O Relatório indica que o aspecto desfavorável à alternativa 1 é a necessidade de passagem na Terra Indígena Waimiri Atroari, porém vale ressaltar que já existe empreendimento nessa condução, no caso a BR-174, que já promoveu a fragmentação do ambiente florestal e as devidas consequências desse processo, assim como o impacto sobre a comunidade indígena, representando, portanto, um corredor de infraestrutura já consolidada”, disse à presidente do Ibama aos índios.

Na carta, Marilene Ramos não explicou aos índios quais impactos ambientais existem nas alternativas 2 e 3, e descartou completamente o traçado n. 4, que, segundo ela, seria o de maior impacto ambiental, pois a região que sofreria a intervenção do Linhão de Tucuruí não conta com rodovias e estradas.
“A alternativa 4 apresenta-se totalmente preservada, sendo um dos aspectos mais críticos e sensíveis, quando se avalia (…) que a abertura de nova zona de uso na região intacta a este da TI (Waimiri Atroari) traria grande pressão de ocupação futura na região e graves impactos ambientais, inclusive sobre a TI”, diz trecho da carta do Ibama.

MPF pede a nulidade da Licença Prévia

O índio Mario Paruwe Atroari com o diretor de Transmissão da Eletrobras,  José Antonio Muniz Lopes (Foto: Mário Vilela/Funai)
O índio Mario Paruwe Atroari com o diretor de Transmissão da Eletrobras, José Antonio Muniz Lopes (Foto: Mário Vilela/Funai)

Com base na carta dos índios Waimiri Atroari ao Ibama, o procurador da República no Amazonas, Fernando Merloto Soave ingressou com uma ação civil pública, no dia 16 de dezembro de 2015, pedindo à Justiça Federal a nulidade da Licença Prévia no processo do Licenciamento Ambiental do Ibama. A ação pede também a condenação da União, do Ibama, da Funai e da concessionária Transnorte Energia S/A à obrigação de fazer a consulta prévia, livre e informada aos índios, nos termos da Convenção nº 169/OIT, “mediante as condições previamente acordadas com o povo Waimiri Atroari”.
Na ação, o procurador Fernando Soave afirma que o ofício do presidente da Funai, João Pedro Gonçalves, dando o aval ao Ibama para a Licença Prévia demonstrou “caráter dúbio” em contraposição aos direitos garantidos e aos interesses legítimos do povo Waimiri Atroari.
“Ao mesmo tempo em que [João Pedro] alerta para os graves danos que estão sendo e serão ocasionados ao povo Waimiri Atroari, que ressalta a situação vulnerável e de recente contato dos indígenas, e reforça a necessidade de consenso entre os moradores (necessidade de decisões coletivas), nada alerta sobre a necessidade de oitiva prévia, livre e informada, nos termos da Convenção nº 169 da OIT”, diz o procurador.


Uma obra à revelia da etnia


José Porfirio Carvalho (de preto) é o porta voz da etnia (Foto: Máio Vilela/Funai)
José Porfirio Carvalho (de preto) é o porta voz da etnia (Foto: Máio Vilela/Funai)
Em entrevista exclusiva à agência Amazônia Real, o porta-voz dos índios Waimiri Atroari, o sertanista José Porfírio Carvalho, afirma que além de não fazer a consulta prévia, a Funai e o Ibama também não concederam o direito aos índios de apresentarem um outro traçado como alternativa da obra dentro da reserva.
“Os índios Waimiri Atroari não tiveram nenhuma opção em decidir ou concordar com nada. Tudo está sendo feito à revelia deles. A sugestão nossa, e que não está sendo considerada oficialmente, é que a linha seja a partir de Caracaraí (RR) passando pela margem direita do rio Branco até Manaus, sem qualquer interferência na Terra Indígena. Não é nenhuma das opções apresentadas pelo Governo. Os Waimiri Atroari não têm nenhum interesse em que essa linha seja construída por dentro de suas terras”, afirmou o sertanista.
José Porfírio Carvalho é coordenador do Programa Waimiri Atroari, que desenvolve ações de saúde, educação e proteção da reserva e possibilitou retirar os índios do risco de extinção por causa de obras de grandes empreendimentos em suas terras. O Programa Waimiri Atroari (PWA) foi criado pela Eletronorte (subsidiária da Eletrobras) na década de 80, após inúmeras mobilizações sociais e do movimento indígena para garantir compensações e mitigações dos impactos causados ao povo Waimiri Atroari pela Usina Hidrelétrica de Balbina.
No dia 1º. de outubro de 2015, o presidente da Funai, João Pedro Gonçalves, acompanhado do diretor de Transmissão da Eletrobras, Antônio Muniz Lopes, e da governadora de Roraima, Suely Campos (PP) participaram de uma reunião dentro da reserva Waimiri Atroari.
Mas o encontro não foi uma consulta pública, segundo José Porfírio Carvalho. Ele disse que as autoridades foram acompanhadas de técnicos do Ibama e do Ministério de Minas e Energia e apresentaram aos índios o projeto da obra, mas não houve entendimento com relação ao traçado dentro da terra indígena Waimiri Atroari, que tem 2,5 milhões de hectares.
“Os índios queriam e querem saber quais as razões concretas da opção de o traçado ser instalado dentro das terras indígenas e não por outra opção. Nem a governadora nem os técnicos do Ibama e do Ministério de Minas e Energia conseguiram explicar os motivos. Nada ficou acertado”, afirma José Porfírio Carvalho.
Porfírio Carvalho assegura que a passagem da linha de transmissão pelo território indígena causará grave impacto ambiental e na vida dos indígenas.
“O principal impacto é o processo construtivo, onde para cada obra estarão circulando dentro de suas terras 100 homens, máquinas, isto multiplicado por 250 [torres] é um impacto de dimensão violenta”, observou o sertanista.
Além disso, os índios temem uma possível invasão de garimpeiros. “Bastará um dos trabalhadores que irão cavar buracos dentro da terra indígena falar que achou uma pepita de ouro ou algumas gramas de outro minério, mesmo que não seja verdade, que a terra indígena será violentamente invadida”, disse Porfírio Carvalho, lembrando o caso dos índios Yanomami, que há mais 30 anos denunciam a invasão de garimpeiros em seu território, em Roraima e norte do Amazonas.
Conforme o coordenador do programa de proteção dos Waimiri Atroari, os índios não exigem compensação da obra do linhão, como já aconteceu na construção da hidrelétrica de Balbina, nos anos 80, e na pavimentação da BR-174, nos anos 90.
“A execução da obra, à revelia deles, pode resultar em confronto. Os Waimiri Atroari não querem dar a última palavra. Eles não querem que o linhão passe dentro de suas terras. Mas ainda não disseram isto publicamente, pois se disserem que não deixam passar, eles vão lutar todo dia para que não seja construída, mesmo que resulte em morte deles como já ocorreu na fase da construção da BR-174”, advertiu Porfírio Carvalho.

 

Funai fica em silêncio a críticas

A agência Amazônia Real procurou a assessoria de imprensa da Presidência da Funai para comentar as críticas dos índios Waimiri Atroari e os questionamentos do sertanista José Porfírio Carvalho sobre a obra do Linhão de Tucuruí na reserva, mas o órgão não respondeu às perguntas enviadas por e-mail.
Em respostas à reportagem, a assessoria da Presidência do Ibama informou que, para concessão de licenças ambientais em situações que envolvem questões indígenas, adota os procedimentos estabelecidos pela Portaria Interministerial 060/2015.
Neste caso da obra da Linha de Transmissão Manaus-Boa Vista dentro da terra indígena Waimiri Atroari, segundo o Ibama, a Licença Prévia (LP 522/2015, de 09 de dezembro de 2015) foi concedida após o recebimento do ofício da Presidência da Funai, em 25 de novembro de 2015. No documento, o Ibama diz que a fundação manifestou as condições que entendeu necessárias para a mitigação dos impactos relacionados ao componente indígena. Tais condições foram observadas pelo Ibama no texto da licença emitida.
“A LP não autoriza o início das obras, ela indica a viabilidade ambiental do empreendimento. Para sua execução é necessária a obtenção da Licença de Instalação (LI). Nesta etapa do processo de licenciamento serão descritos os planos de programas ambientais e medidas de controle de impacto, incluindo os impactos relacionados aos povos indígenas”, afirma a nota do Ibama.

Fim de apagões em Roraima

A governador de Roraima, Suely Campos (PP) durante reunião na aldeia (Foto: Mário Vilela/Funai)
A governador de Roraima, Suely Campos (PP) durante reunião na aldeia (Foto: Mário Vilela/Funai)
Desde o ano de 2001, o Estado de Roraima é abastecido pela transmissão de energia da hidrelétrica de Guri, na Venezuela. Ainda que o contrato seja de 20 anos para fornecimento de 200 megawatts, o país vizinho tem reduzido sistematicamente o fornecimento de energia, que tem sido suprido com o uso de termelétricas roraimenses. Mesmo assim a capital Boa Vista, que tem mais de 320 mil habitantes, sofre com apagões e queda de energia contínuos.
Segundo o Governo de Roraima, o Linhão de Tucuruí suprirá a deficiência no sistema energético do Estado. A linha de transmissão vai atravessar as cidades amazonenses de Manaus, Rio Preto da Eva e Presidente Figueiredo, além das roraimenses Rorainópolis, Mucajaí, Caracaraí, São Luiz, Cantá, chegando em Boa Vista.
Em respostas às perguntas da Amazônia Real, a assessoria de imprensa da governadora de Roraima, Suely Campos, confirmou que ela participou da reunião no dia 1º de outubro dentro da TI Waimiri Atroari a convite da Funai.
“Nesta ocasião, a governadora pediu que eles [os índios] consentissem a obra, levando em conta que o impacto ambiental seria mínimo e o linhão é fundamental para o desenvolvimento do estado de Roraima, que sofre risco de apagão. Guri não atende mais a demanda do estado. Somente este ano já foram instaladas três termelétricas, visando atenuar o problema”, diz a nota.
O Ministério de Minas e Energia também foi procurado para comentar as denúncias dos índios Waimiri Atroari, mas a assessoria respondeu que as respostas das perguntas estavam em nota divulgada no site do órgão.
Segundo a nota, a obra o Linhão de Tucuruí apresenta atraso no cronograma de cinco anos. A linha foi licitada em setembro de 2011. O contrato de concessão, com o consórcio Transnorte, formado pela Eletronorte e a Alupar, foi assinado em janeiro de 2012. A obra deveria ter entrado em operação em janeiro de 2015. Mas a justiça acatou pedido do Ministério Público Federal para embargar a obra.
O caso aconteceu em 2011, quando a Justiça Federal declarou a nulidade do leilão da Aneel de um dos lotes da linha de transmissão e suspendeu o processo de licenciamento ambiental. O traçado escolhido pela Transnorte estava em área delimitada como ocupação dos índios isolados Pirititi, em Roraima.  A ação do MPF questionava também o edital para as obras do linhão por não considerar outras alternativas de locais para o traçado e a falta de consulta aos indígenas na definição da área escolhida. Os efeitos da liminar foram suspensos pelo Tribunal Federal da Regional da 1ª. Região.
Em nota divulgada pela agência Eletronorte na internet, a Transnorte Energia S/A se apresenta como uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) composta pela Alupar, com 51% de participação societária, e Eletronorte, com 49%. A concessionária da Linha de Transmissão Manaus-Boa Vista diz que já investiu na obra R$ 250 milhões, recursos que contemplaram estudos relativos ao empreendimento, planejamento, aquisição dos cabos, principalmente, na aquisição, instalação e colocação em operação do compensador estático. A previsão de investimento total era da ordem de cerca de R$ 890 milhões.
Sobre a emissão da Licença Prévia do Ibama, o diretor-técnico da Transnorte, Raul Fernando, Ferreira disse, segundo a agência Eletronorte, que a concessionária estava buscando parceiros para fazer o Plano Básico Ambiental Indígena (PBA-I) para obter a Licença de Instalação (LI) e iniciar as obras. “Esse trabalho de interação com as aldeias, juntamente com a Funai e o Ibama, depende das atividades da comunidade indígena. A construção da linha está prevista para um prazo entre 20 e 24 meses, após a aprovação do Plano Ambiental e da posterior emissão da LI”, afirmou em nota.

Índios morreram em obras da ditadura


A nova geração dos Waimiri Atroari (Foto: Mário Vilela/Funai)
A nova geração dos Waimiri Atroari (Foto: Mário Vilela/Funai)
Os índios Waimiri Atroari se autodenominam “kinja”, palavra que significa “gente” na língua Karib. Há 45 anos, eles não tiveram voz que impedisse a construção da rodovia federal BR-174. Também não foram ouvidos quando foi construída a usina hidrelétrica de Balbina dentro de seu território, que fica na divisa entre os Estados do Amazonas e Roraima.
Nos anos 70, outro projeto governo militar que afetou a TI Waimiri Atroari foi a implantação da mineração Grupo Paranapanema. Um decreto presidencial desapropriou parte das terras dos índios para a produção de cassiterita.
Segundo José Porfírio Carvalho, dos 1.500 indígenas Waimiri Atroari que viviam no território em 1971, início da construção da rodovia federal BR-174 pelo Exército brasileiro, 1.126 morreram durante a obra, que foi finalizada em 1977.  Dos 974 km de rodovia abertos, 125 km cortaram o meio da terra indígena Waimiri Atroari.
Em 1996, os índios Waimiri Atroari foram indenizados com um pagamento de R$ 1,7 milhão pelos governos do Amazonas e de Roraima por danos socioambientais causados pelas obras de pavimentação da BR-174. Apesar da indenização, os indígenas mantêm o bloqueio para o transporte de veículos na estrada, das 18h às 6h. O objetivo é diminuir os atropelamentos de animais silvestres e de índios, que caçam no período noturno.
O Governo de Roraima moveu uma ação contra o bloqueio, justificando que ele dificulta o desenvolvimento econômico do Estado. O processo tramita na Justiça Federal.
Conforme parecer do Ministério Público Federal de Roraima, a construção da BR-174 provocou um impacto devastador à organização social, aos costumes, crenças e tradições do povo Waimiri Atroari, infringindo direitos humanos e direitos fundamentais, atualmente expressamente reconhecidos pelo artigo 231 da Carta Magna, além da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
As mortes dos Waimiri Atroari durante a ditadura militar foram denunciadas à Comissão Nacional da Verdade (CNA) em 2013, mas nenhum militar foi responsabilizado.

A inundação de Balbina

Integrante do consórcio que formou a Transnorte Energia S/A para construir o Linhão de Tucuruí, a Eletronorte foi a responsável, em 1985 a 1989, pela obra da Usina Hidrelétrica de Balbina, no Amazonas. O lago que formou o reservatório da usina inundou 30 mil hectares de floresta da terra indígena Waimiri Atroari.
Segundo documentos públicos da Eletronorte, duas aldeias foram realocadas do local original para outra parte do território. Para mitigar os danos, a Eletronorte fez um convênio com a Funai para desenvolver ações de mitigações na área inundada e compensar financeiramente os índios atingidos pela obra. Os valores da compensação nunca foram divulgados.
Os recursos propiciaram a criação do Programa Waimiri Atrori que há 30 anos desenvolve ações integradas nas áreas de saúde, educação, proteção ambiental e apoio à produção alimentar, o que permitiu a população sair do risco de extinção. A população só conseguiu se recuperar com as ações do PWA.
Mas especialistas do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpe), como o ecólogo Philip Fearnside, afirmam que Balbina foi o maior desastre ambiental da Amazônia e um erro financeiro, pois sua potência energética de 250 megawatts foi insuficiente para abastecer Manaus, hoje com mais de 2 milhões de habitantes.
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Waimiri Atroari dizem que autorização do licenciamento já causa conflitos (Foto: Mário Vilela/Funai)

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